quinta-feira, agosto 22, 2013

Ódio

Ah como aquela criança odeia o mundo! Um mundo tão cruel e injusto, sórdido se capaz de vilanias impensáveis por mentes mais pudicas e hipócritas.

Sofridas especialmente por crianças como aquela.

Um mundo de adultos, um mundo de machos, um mundo onde algemas são presas à seus pulsos para dominar seu corpo e sua essência. Para moldar sua mente aos desejos desse mundo perverso, à moral hipócrita de uma sociedade decadente. Aos medos corrosivos de antigos dominadores.

Ah como isso funcionou com milhares e milhares de crianças! Mas com uma criança o resultado foi adverso. Ela não se tornou uma cria perfeita da sociedade hipócrita, mas sim um pequeno monstro predador entre ovelhas submissas.

E ela odeia, odeia, odeia o mundo com todas as suas forças! Ela também odeia as outras crianças que, diferente dela, cresceram como o mundo esperava, suas ovelhas submissas. Mas, acima de tudo, ela odeia do fundo de sua alma pervertida, as crianças que o mundo não conseguiu domar com suas algemas.

Ela as odeia assim, pois as inveja, pois as teme. Ela sabe que só as crianças livres poderiam enxergar sua verdadeira natureza se tivessem a oportunidade. Mais e mais dessas crianças livres vêm surgindo e apesar disso só fazer seu ódio aumentar, ela ainda consegue evita-las.

Mas em seu ódio generalizado ao mundo e todos os seus tipos de crianças, nossa criança estranha precisa se alimentar! E a única forma de saciar a sua fome, desde muito pequena, desde que conseguiu se livrar pela primeira vez das algemas que a prendiam, era matar.

Sim, matar, e a criança não tem medo de admitir isso para ela mesma! Sua primeira experiência com o bichinho de estimação de sua irmã mais nova. Aquela bolinha de pelo não teve chance alguma!

Acontece que isso não era o bastante e a fome não se contentaria com um pequeno animal. Ela precisava de outras crianças e de outras crianças ela se alimentou.

Ah como eram tenras e suculentas as mortes das dóceis crianças algemadas às leis desse sórdido mundo! Tenras, suculentas, fáceis, cansativas, enjoativas.

_ CHEGA! – Gritam seus pensamentos de criança pervertida!

Ela precisa de algo novo e a única coisa nova em nosso mundo são também exatamente as coisas que mais teme: as crianças livres, as crianças que pensam, as crianças que podem enxergar sua alma sórdida e faminta; mas apenas quando elas a encontram primeiro...

Sua explosão havia acontecido logo após uma “refeição” que não a alimentara, e foi com grande choque que ela percebeu que, ao lado de sua última criança dócil, ainda caída ao chão, uma outra criança olhava o mundo de forma diferente. Ela estava visivelmente cansada de tudo aquilo, mas era nítido o brilho em seus olhos que mostrava sua insatisfação com o mundo.

Não, ela não era uma criança pervertida e sórdida como ela. Ela era uma criança livre e, por ser como é, despertou seu desejo!

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