quarta-feira, julho 31, 2013

Algemas

Quando ela chegou ao escritório o assunto não era outro: o péssimo estado em que aquele rapaz estava, todo roto e com um caminhar vacilante. Muitos sentiam pena da pobre criatura, mas o maior sentimento era um misto de curiosidade e medo, já que ninguém se atrevia a perguntar o que havia acontecido.

Como ela sempre chegasse atrasada, percebeu que naquele ponto muitas teorias já haviam sido levantadas, mas uma ganhava força entre as moças na sala de café:

_ Parece que ele foi parar na delegacia depois de uma briga!

_ Típico desses rapazes com tempo de sobra e miolos de menos...

_ Sim, só pode ter sido isso... E vai saber o que aconteceu com ele no xilindró...

Mas aquilo lhe causava estranheza, já que o conhecia bem, talvez bem até demais.

Há algum tempo eles tiveram um breve romance o qual ela terminara peremptoriamente, ao perceber que apesar de inteligente e levemente divertido, faltava um quê de imaginação. Mas ainda assim eles continuaram amigos e lhe agradava saber que o rapaz, na verdade, estava sob seu controle.

E ela sabia que, apesar do interesse contido que ele ainda nutria – e a ela agrava saber disso –, uma outra mulher havia aparecido na vida dele. “Não ia durar” era o que ela imaginava dada à profissão da moça e a algumas taras curiosas que ele acabou por confessar em um bar após o expediente.

Quando ela finalmente o viu, voltando de uma reunião, deu para perceber que muitos dos comentários faziam jus ao estado dele. Não, não haviam marcas no rosto – ah, a outra saberia como evita-los –, mas seu andar era vacilante, as roupas não estavam alinhadas como de costume, a cabeça não parava de verificar o estado das pontas dos próprios sapatos e eram visíveis as marcas ao redor de seus pulsos.

Preocupada ela foi até ele, tocou em seu ombro e ela pode sentir o tremor sob o tecido da camisa; sim, ele havia se assustado!

A tensão no escritório cresceu quando todos perceberam que alguém finalmente tinha tido a coragem de conversar com o rapaz, mas ninguém conseguiria ouvir a conversa dos dois. Afinal ela sabia que discrição era fundamental naquele momento.

Então baixinho ela perguntou a ele ao entregar uma xícara quente de café:

_ Ela usou as algemas novamente?

E nesse instante, mesmo sem olhar para ela, aquele leve sorriso no canto dos lábios do rapaz traiu toda a impressão de mal-estar que ele transpirava. Nesse instante, já sem mostrar o sorriso, mas com um brilho eufórico, se não histérico, nos olhos, ele confirmava com a cabeça ao responder no mesmo tom da pergunta:

_ E o cassetete também!

Então, naquele momento, apesar de aliviada, ela sabia que o havia perdido. Virou as costas com uma máscara de falsa compaixão e desalento, só para deixar o pessoal do escritório ainda mais curioso, e, no caminho até a sua mesa, sorriu para o novo estagiário da empresa.

_ Afinal – ela pensou – preciso de um novo adorador por aqui...

E sentou-se satisfeita em frente a seu computador.

Um comentário:

Anônimo disse...

Gente... :0