quarta-feira, fevereiro 03, 2016

Um Conto de Carnaval

A semana passava e sua inquietação era crescente! Finalmente chegava a hora de voltar a ser ele mesmo, uma criatura de que, mesmo que não exatamente se orgulhasse, ao menos não o fazia sofrer, não o mantinha vazio, não o atormentava à noite.

Com a chegada da sexta, ele praticamente não se continha: mas tinha que se segurar um pouco mais, manter aquela imagem por mais um tempo mais oito horas...

Sete horas...

Seis horas...

Quatro horas...

Três, duas, uma: já chega, ele sairia um pouco mais cedo hoje, e foi sem remorso que marcou o ponto com somente dois minutos de atraso!

E então correu livre, como não corria há tempos, ele precisava chegar em casa!

Finalmente era chegada a hora, e era com um misto de raiva e asco que ele olhava para aquela fantasia. O espelho não escondia os sinais de desgaste, os cantos puídos e rotos. O caimento mal-ajambrado de uma roupa que serviu a alguém maior.

Então ele rasgou ali mesmo os panos ásperos que o cobriam e feriam sua pele. Mas era um ritual para que ele se libertasse com o esforço necessário de sua crisálida! E estivesse pronto para sua nova vida...

Ainda pisando sobre aqueles restos decrépitos, ele alcança dentro do guarda-roupas seu novo manto sagrado e conforme amarra o sarongue e veste os coloridos colares de contas, uma transformação acontece: o colorido das vestes atrai um repique novo no peito, seus passos tornam-se ritmados como um maracatu, sua mente está ágil e ligeira como um bom frevo, marchinhas de hoje e outrora ecoam em seus ouvidos.

Ele está pronto para o momento máximo de sua vida, para libertar a felicidade que é obrigado a conter por meses, preso a obrigações que para ele são mundanas. Só no carnaval, nesses poucos dias de carnaval, ele se sente vivo de verdade e não perderá isso por nada. Vai beber, vai rir, vai pular, vai dançar, fará tudo o que sua vida de verdade permite e exige. Viverá o ano em 5 noites e 4 dias, pois é para isso que tolera os demais 360.

Chegou então a hora de passar pela porta da rua e trancar tudo bem trancado, pois ele só voltará, aliviado e ainda feliz, na manhã da quarta-feira de cinzas, quando então vestirá a amarga fantasia do dia-a-dia.

Mas essa verdade triste não apagará os dias e noites de sua verdadeira vida: muito menos o impedirá de se preparar para o próximo CARNAVAL!

Nota do Editor:
Conforme bem sugerido pela grande Maria Carolina, ESSA AQUI é a trilha perfeita para essa música.

Um comentário:

Marianna disse...

Não me leve a mal, hoje é Carnaval ... :)