sexta-feira, abril 03, 2009

Sobre a saudade

Eu acho a palavra saudade tão bonita! Não sei se pela mística de só existir em português (ao menos foi o que sempre ouvi dizer), ou simplesmente por me passar algo bom, uma sensação gostosa.

Por mais estranho que pareça, gosto de sentir saudades. Quando sei que vou rever uma pessoa ou lugar, reviver certos momentos, e crio certa expectativa, é um sentimento que preenche a minha alma.

Não gosto, porém, de sentir saudades de pessoas que saíram da minha vida de forma repentina, com as quais não houve um desentendimento, uma briga, mas que mesmo assim você não se sente a vontade para voltar a procurar. Dá uma sensação de vazio enorme, vontade de saber como a pessoa está, como está a vida dela, se conseguiu resolver ou não determinados problemas, enfim, retomar contato com a pessoa.

Um dia desses, pensando com meus botões, me peguei divagando sobre a modernidade tecnológica na qual vivemos hoje e se a saudade que sentimos atualmente em algo se parece com aquela de 20 anos atrás, quando ainda não existiam facilidades como celular, e-mail, msn, skype, esses dois últimos, os mais próximos da realidade, na minha opinião.

Não tenho dúvidas de que através desses meios é possível amenizar a falta que se sente de alguém. Mas até que ponto funciona? A distância, maior ou menor, sempre existe, mas em muitas vezes esse é um problema contornável que acaba sendo adiado pela facilidade que a comunicação moderna nos proporciona ou pela correria o dia a dia. Quantas vezes não optamos por telefonar ou ficar conversando com alguém no MSN ou algo que valha, em vez de marcarmos um encontro real? E por mais que fiquemos horas conversando com alguém, acho que o olho no olho é insuperável. Uma boa conversa ao vivo acompanhada de uma bebidinha e uns petiscos pode ser infinitamente mais agradável.

Ao se falar em saudade, normalmente pensamos em pessoas. Mas esse é um sentimento que ultrapassa a barreira do contato humano. Sente-se saudades de lugares onde já vivemos ou nos quais passamos um período curto, mas inesquecível. Sente-se saudade de cheiros que trazem lembranças, seja de um perfume ou de uma comida. Sente-se saudades de algum prato ou quitute que sabemos que nunca mais comeremos. As saudades que músicas podem trazer são infindáveis. É possível até sentir saudade de um emprego, seja pelo fato do atual não ser tão interessante, ou por não existir um atual. Mas aquela que me dói mais é a saudade de um tempo que não volta, quando não tinha muito com o que me preocupar, nada muito sério no que pensar.

Para uma pessoa confessamente nostálgica como eu, a saudade está por todo lado. Porém, não se manifesta em tempo integral. Ela fica quietinha, adormecida, até que algo pode fazer ela se manifestar, de maneira alegre ou não.

Tenho saudades ...
... do perfume que usava quando passei férias na Europa. Posso até comprar outro, mas o cheiro dele nunca mais será o mesmo.
... do risoto de lula e brócolis que uma antiga empregada fazia. Mesmo que coma um muito bom, não vai ter aquele gostinho especial que esse tinha.
... de dezenas de pessoas que deixei no Rio ou que estão aqui mesmo em São Paulo, mas não fazem mais parte da minha vida.
... do apartamento onde morei no Rio por quase 15 anos e do qual tenho inúmeras memórias.
... de andanças pelas manhãs de sábado que fazia com a minha irmã nas ruas badaladas de São Paulo.
... dos meus felinos que morreram, mesmo tendo outros dois lindos em casa atualmente.
... de um estágio que me permitia ir almoçar em casa todo dia e ainda tirar um cochilo depois.
... de quando fazia aula de espanhol com a minha irmã e nos divertíamos horrores.
... de quando meu pai me deixava no colégio num fusca bicolor que nos envergonhava e ele ainda gritava de sacanagem pra não fumar maconha.
... das baladas rock’n’roll que fazia com 3 amigas num bar de São Paulo.

E por aí vai... Mas, infelizmente nada disso vai voltar a acontecer, o que me deixa um pouco melancólica se começar a pensar no assunto. Algumas dessas lembranças podem até voltar a fazer parte do presente, mas nunca mais da mesma forma, carregando o mesmo peso, o mesmo significado que tinham quando aconteceram.

E você, do que tem saudades?

4 comentários:

Muta disse...

pois é, a saudade não é apenas "sentir falta" de algo... é sentir falta de algo que muitíssimo provavelmente não acontecerá mais... e só existe em português, pois a idéia da palavra - e do sentimento - surgiu principalmente quando das grandes navegações; as pessoas iam para o mar e essas pessoas provavelmente nunca mais veriam sua terra natal novamente e, os que ficavam, nunca mais os veriam novamente. e esse sentimento veio pra cá também, depois tbm foi incorporado aos escravos brutalmente arrancados de suas terras, aos índios que nunca mais teriam a sua terra como antes e etc...

agora, sobre as minhas saudades, hehe, existem muitas parecidas com as suas, claro, mas as que realmente doem eu prefiro não falar.

ps.: sinto falta do tempo em que vc colocava a categoria nos textos... não é saudade, pois espero que volte a fazê-lo, hahahah. =P

Paulinha disse...

e quem duvida que o muta é cultura levanta a mão...

bom, sou nostálgica e tenho saudades de milhões de coisas:
como carregar minha irmã no colo e coloca-la pra dormir
o tempo que passava na escola a mais só para conferir o treino de basquete do menino que eu gostava
de quando podia passar tardes pintando com aquarela
de garimpar um CD em uma loja, abri-lo e degustar faixa por faixa...
e a lista nunca acaba...

post gostosinho!

juliana disse...

Oi, Rafa
Adorei seu texto!
Até, tive saudade de um momento e alguem que não vejo a tempos!

Abs
Juliana

Lótus disse...

essa história de "saudade" só existir em português é meio balela, na minha opinião. nenhuma palavra pode ser traduzida com 100% de precisão. basta constatar que, às vezes, qdo nos esquecemos de uma palavra, usamos várias outras para defini-la, mas sempre ressalvamos "q não é bem isso" que queríamos dizer (pq somos pessoas autocríticas e valorizamos as palavras e a força de cada uma delas). enfim, não há equivalente perfeito para "saudade" assim como não o há para inúmeras outras palavras. ;o)

e eu tenho saudade do meu pai, q já faleceu. da minha mãe, qdo não brigava tanto comigo. dos meus irmãos, qdo brigavam comigo. da minha barriga de grávida (e do meu filho dentro dela). da minha melhor amiga, qdo ainda a chamava assim. das contrações do trabalho de parto (depois q passam, são a coisa mais divina do mundo!).

tenho saudade dos treinos terríveis e das competições exaustivas de natação. das paqueras correlatas (jamais correspondidas, suspiro...). do cheiro de cloro no cabelo. dos bentôs devorados no intervalo do almoço.

eu tenho muita, muita saudade de quando eu chorava horrores ouvindo uma música e, depois de enxugadas as lágrimas, estava tudo bem. não consigo nem uma coisa nem outra agora.